Espero por ti

 

Espero por ti

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I

Espero por ti. Há tanto tempo que espero por ti e nunca mais chegas. Ponho de lado a revista, pego no livro. Leio uma linha e levanto a cabeça a ver se vens aí. Nada. Levanto-me. Estico-me. Espero-te. Todos os dias desde há tanto tempo.

Então penso em ti. Ouço o teu riso na minha cabeça, como uma música que tenha gravado para nunca mais esquecer. E é esse riso feliz que me ampara de noite, quando adormeço no sofá e espero que o dia volte. Sonho que me tocas e acordo. Em sobressalto. Mais uma memória, não és tu. Sou eu. Só eu. Está calor e abro a janela para a noite sem lua. O ar quente entranha-se-me na pele, formam-se gotas de suor no meu pescoço, que imagino serem os teus lábios, os teus beijos, o teu cheiro.

Regresso ao meu banco na estação. Levanto o olhar a cada comboio que chega, expectante quando as portas se abrem, e os passageiros ganham o chão do seu caminho. Eu estou aqui e tu? Virás? Passou algum tempo, não somos os mesmos. Passaram anos, demasiados talvez. Outras pessoas. Pensarias em mim quando estavas com outras? Eu pensei em ti. Muitas vezes. Demasiadas. Por isso imagino o que poderia ter sido. Imagino incansavelmente. É esgotante pensar tanto. Querer sempre o que não se tem, achando que o que se quer é o que se merece.

Arrefece. Visto o casaco. Lembro a noite em que vagueámos sós pela cidade. De madrugada ficou mais frio, a noite engoliu o Verão só para os teus beijos me fazerem arder. Bebemos vinho ao pé do rio e o céu foi ficando mais claro. Uma noite é o ciclo do que quer que houve. Isso e a promessa do reencontro aqui, no mesmo lugar, uma experiência angustiante, todo este tempo atormentada pelo “se”. Se eu esperar ele também espera? Se eu for ele também vai? O dia chegou, eu estou aqui, com os sons daquela noite e o teu cheiro na memória.

II

No comboio o tempo passa devagar e eu tenho pressa de te ver. Porquê tanto tempo para este reencontro? Tanto tempo perdido à espera, enganando os dias com encontros superficiais e as noites com outras na minha cama. Éramos miúdos mas eu sabia, nessa noite, que estaria aqui, hoje, neste dia marcado.

Quando sair do comboio será da mesma forma? Virás contra mim sem veres por onde andas? Distraída com as malas procurando a linha, atrasada para a ligação seguinte? O comboio não esperou que os nossos olhos se largassem, e ficámos sós, a meio das viagens, numa encruzilhada de desejos novos.

Olho pela janela e reconheço a paisagem. Ainda estou longe e já procuro por ti. Virás ter comigo?

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