Labirinto

 

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Vicente sentou-se na cama, atordoado com o toque inesperado do telemóvel. Eram 3 da manhã. No ecrã aparecia o nome de Tiago. Atendeu, desorientado e sentindo a boca seca. Do outro lado a voz do irmão, aflita e sussurrante. “Vicente…! Vem ter comigo! Eu estou…” pausa “Nem sei, acho que ao pé daquela loja onde estivemos de manhã…?” Vicente esfregou os olhos e respirou fundo. Que fazia Tiago na rua, em Istambul, àquela hora? "Não consegues regressar?” perguntou-lhe serenamente “É quase aqui ao lado”. Receava que o irmão tivesse sucumbido novamente à tentação da cocaína. Parecia estar fora de si. “Não me consigo orientar, são só labirintos, tu sabes! De noite é pior ainda pa!” “Calma! Eu vou aí ter, mantém-te ao telefone ok?” Já estava levantado. Podia ouvir a respiração ofegante do outro lado, numa crise de ansiedade que se anunciava. “Já estou a sair” – Ia tropeçando ao vestir as calças só com uma mão livre. “Despacha-te antes que elas dêem comigo…” a voz denunciava terror. “Elas quem?” Tinha que o manter a falar. “Estas coisas pa! Estão cada vez mais perto…!” conseguia ouvir-lhe as lágrimas eminentes, e o seu coração apertou-se pelo irmão mais novo. Fora sempre tão frágil! “Não estás a fazer sentido. Eu já saí a porta, mantém-te comigo ouviste?” Mas Tiago calara-se, e ouvia agora algo…gemidos? Grunhidos? “Tiago?! Tiago!” A chamada caíra e o telemóvel estava agora desligado. Acompanhado pela batida apreensiva do seu coração correu até chegar ao local, e nem sinal dele. A rua estava deserta, o silêncio era ensurdecedor. Com medo de o encontrar novamente caído, com convulsões, deu umas voltas nas ruas paralelas chamando o seu nome, em vão. Quando tentou regressar ao ponto de partida, constatou que estava perdido também. De noite tudo parecia diferente, o irmão tinha razão… Não via ninguém mas era como se sentisse presenças à sua volta. Era sugestão, ele sabia, mas ainda assim o coração acelerou e um suor frio arrefeceu-lhe as mãos trémulas. Depois ouviu aquele som…grunhidos, gemidos? Estava desorientado como nunca se sentira naquela cidade labiríntica. Tentou pegar no telemóvel para pedir ajuda a alguém, mas as mãos não se moveram. Tentou voltar ao hotel, mas as pernas não se conseguiam mover. Abriu a boca para gritar por socorro, mas não emitiu qualquer som, paralisado de terror perante as sombras que o rodeavam, devoravam, debruçadas sobre ele numa enorme mancha negra… Acordou assustado. Sentia o suor que lhe encharcava o cabelo e o tremor que lhe sacudia o corpo húmido e frio. Depois o alívio: fora tudo um sonho…! Respirou fundo, com um sorriso ainda indeciso. Estava tudo bem! E então o telemóvel tocou. Eram 3 da manhã, e no ecrã aparecia o nome de Tiago.

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