O Psiquiatra e o Comentarista

 

O Psiquiatra e o Comentarista

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O consultório do psiquiatra estava quase vazio àquela hora do dia. Faltavam ainda poucas pessoas a serem atendidas, entre elas destacava-se um senhor quase grisalho, que estava muito inquieto com a demora em ser atendido.

- Por que a demora, perguntou ele à secretária, que parecia bastante cansada.

- O doutor já vai atendê-lo, aguarde só mais alguns minutos, disse ela, sendo o mais gentil possível.

- Mas estou aqui há quase uma hora e quero ser atendido logo.

Não demorou muito e o senhor grisalho foi convidado a entrar no consultório do psiquiatra.

-Boa tarde, senhor, como devo chamá-lo?

- Chame-me do que quiser, falou ele ao psiquiatra.

- Sente-se e fique à vontade.

- À vontade eu não fico, não, doutor.

- Então me diga o motivo do senhor estar aqui. Como posso ajudá-lo?

- O problema que me aflige é que eu sou Comentarista.

- Muito bem. E o que o senhor quer dizer com isso?

- Doutor, eu tenho um problema sério, respondeu o Comentarista.

- Então vamos ver como posso ajudá-lo. O senhor disse que é comentarista?

- Sim,doutor. Eu não consigo parar de comentar.

_ E que comentários o senhor faz?

- Comento o que acho que devo comentar.

- Então vamos ver sobre o que o senhor comenta.

- Pois doutor, eu comento aquilo que eu faço.

- E o que o senhor faz?

- Eu sou comentarista, doutor.

- Isso eu entendi. No que posso ajudá-lo?

- Eu preciso comentar, doutor.

- Então,comente.  Até o que eu entendi, o senhor disse que é comentarista.

- Sim,doutor. Eu comento tudo. Tudo o que eu mesmo faço, eu comento.

- Então vamos ver onde está o seu problema.

- Aí é que está o problema, doutor. Eu não consigo parar de comentar.

- Este é um caso grave, mas vamos resolver.

- Por favor, doutor, existe algum outro sintoma que o senhor tenha percebido e não quis me falar?

- Na verdade, certos sintomas eu gostaria de não ter que comentar.

- Mas eu preciso saber por  que não consigo parar de comentar,doutor.

- O seu caso não é raro, pelo o que eu pude observar. O senhor tem um profundo desejo de ser uma coisa que o senhor não é.

- Eu só comento as coisas que eu mesmo faço, disse ele ao doutor.

- Pois vamos fazer o seguinte. Vou lhe receitar um medicamento e o senhor vai seguir a receita direitinho.

Vou lhe dar uma amostra grátis: neste frasco estão contidas algumas gotas de Semancol, que é um medicamento que lhe fará perder a vontade de comentar.

- Mas doutor, se eu não comentar as coisas que eu faço,  quem irá comentar?

 

Débora Benvenuti

https://ilusoesdeoutono.blogspot.com/2019/12/o-psiquiatra-e-o-comentarista.html

 

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