HÁ DIAS ASSIM

 

HÁ DIAS ASSIM

Português
Fotógrafo: 

HÁ DIAS ASSIM

 

Que dia desastroso!

O trabalho exasperara-lhe os nervos. Deixara tudo em pantanas e pirara-se a sete pés, morto por um duche e por relaxar, calmamente, no sofá, enquanto tomava um whisky, antes de jantar.

A mulher já andaria pela cozinha, como era habitual. Ele ficaria a ver um pouco de televisão – o seu canal preferido “História” –, à espera que ela lhe dissesse ao ouvido:

– Está pronto o jantar, querido!

– Mas que porra é esta? Um homem chega a casa e nem aqui pode ter um pouco de sossego? Que bagunça é esta? Onde se terá metido a Luísa?

Tudo lhe passou pela cabeça. Um desastre, um assalto, a Luísa morta… Tinha que ser naquele malfadado dia. Que diabos!

De uma penada percorre a casa – e… nada –; a Luísa sumira!

De repente viu algo reluzente sob a da mesinha da sala de estar. Um bilhete? Estranho!

“Surpreendido? Fui…”

Assim, sem mais nada. Surpreendido é pouco… Encornado, era como me sentia. Traição?

É assim, um homem chega a casa e leva com um par de cornos, sem saber como nem porquê?

“Seria?” – a dúvida persistia.

Pegou no telemóvel para lhe ligar. De seguida atirou com ele. “Mas que diabos estás tu a fazer? Que culpa tem o telemóvel se a Luísa se pirou?”

Foi colando os pedaços do telemóvel, enquanto remoía os pedaços da sua história, da sua vida. “Surpreendido? Fui…”, duas monótonas palavras apenas. Restava-lhe descobrir para onde, porquê e com quem.

Os ciúmes eram intensos. Maldita!

Vasculhou as gavetas. Tudo nos seus lugares. Não poderia ir longe, a não ser que…

O telemóvel tocou. Olhou o écran: Luísa. Atendeu num ápice:

– Que merda é esta Luísa? Onde andas?

Do outro lado, primeiro um silêncio. Depois, gargalhadas histéricas. Vozes misturadas, embriagadas. No fim uma voz entaramelada:

– Fui…!

– Mas foste para onde?

– ….

– Luísa responde? Estás embriagada?

– …

– Só posso crer que sim. Onde quer que estejas, fica bem.

Bruscamente desligou o telemóvel. Malvada seja. Um homem chega a casa e… um silêncio e um vazio.

Fez uma introspeção. Nada que não merecesse.

– Podia ter escolhido outro dia – pensou alto –, e lá diz o ditado: “Uma desgraça quando vem, nunca vem só”.

 

NATÁLIA VALE

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Sem dúvida que, por vezes,

Sem dúvida que, por vezes, acordamos do "avesso".

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