Sem barulho.

 

Sem barulho.

Português

Aprendi a bater palmas sem fazer barulho. Agora aplaudo quem quero sem incomodar ninguém. Nunca gostei de incomodar. Um dia precisei tratar a perna com uma ferida antiga que infeccionou. Tinha dois grandes buracos nela, um maior e outro menor. Ambos extremamente dolorosos, tanto que nem para dormir tinha posição e caminhar era impossível. Tratei-as sozinho. Não sou mais valente que ninguém mas nunca quis incomodar o médico. Quanto aos meus amigos, coitados, sabemos lá com que feridas estariam eles próprios a lidar. Lembro-me de comprar o soro para lavar a lesão após o banho. A água que tocava a zona o joelho assemelhava-se às unhas de todos aqueles a quem nunca soube salvar a vida: Impiedosa, lancinante, superior a qualquer laivo de defesa inocente da minha parte. Não fui queixar-me a ninguém. Ninguém gosta de um queixinhas e eu até gostaria que alguém gostasse de mim. Comprei duas caixas de compressas. Uma para limpar as feridas após o banho e a segunda para as colocar na boca e morder enquanto tocava na perna sem gritar. Afinal de contas tenho vizinhos. Não quero incomodar ninguém e agora até aplaudo sem fazer barulho. 

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